Monday, July 27, 2015

Todtnauberg 3

TODTNAUBERG 3

O vazio de tudo, antes corria um vento
e sons longínquos davam-nos conta de um acontecer,
fluir magistral do rio sempre pela primeira vez,
o aviso sonoro do corvo
e o caminho a perder-se na montanha.

Vendrá viniendo con venir eterno,
dizia Unamuno.
O mestre não conheceu Unamuno,
porque só há duas línguas decentes para a Filosofia, o grego e o alemão.
E depois só há um povo decente, mas não vamos por aí...

Hannah, Paul, vocês sabem que eu nunca traí.
Nem o Reitorado me deixaram...

TODTNAUBERG 2

TODTNAUBERG 2

Há um campo liso por detrás de todas as montanhas
a lembrar-nos que a beleza conduz ao vazio
e quem não souber glosar este tema
pode sempre patinar por cima de gelo liso,
"paraíso para quem sabe dançar", dizia o outro, o de Sils Maria,
antes de enlouquecer.

O velho não enlouqueceu. Sabedoria manhosa dos camponeses de Bade.
Esperar no dia a dia do sendo o acontecimento do Ser,
virado para a Morte no regaço do Tempo
(em alemão é assim, sempre com maiúsculas) e entretanto mentir,
mentir à mulher, mentir aos alemães, aos nazis, aos americanos
e depois aos franceses e finalmente receber os judeus,
ele "o mestre vindo da Alemanha" a olhar "os teus cabelos negros, Sulamita"
nos caracóis da Hannah Arendt. "Tantos anos" murmurou...

Habitava poeticamente, como dissera do outro de Tubingen,
numa cabana pequena e sem nada de particular,
fechada agora e na posse da família.
Sabedoria dos camponeses
de Bade Wurtenberg...

(citações do poema Fuga da Morte de Paul Celan)




Todtnauberg

TODTNAUBERG

Também eu, aqui. Um grupo de escuteiros
nos caminhos do bosque a pedir boleia
para o grande albergue de juventude no cimo do monte,
donde irradiam marchas a pé boas para a saúde e para a forma. Fitness.
Num abrigo dos Serviços de Turismo da Floresta Negra
um mapa mostra o "Heidegger weg",
alguns quilómetros de marcha contra o esquecimento do Ser
e todos os outros esquecimentos. Fitness.

"Palavras cruas" ouviu o motorista de Celan
e o poema reproduziu desencantados dizeres,
meio ardidos, como palavras decifradas num papel desfeito em cinzas
na lareira de uma longínqua cabana de montanha.

Elfriede tomava conta de todos os passos dele,
sabedora de que a benevolência só conduz à devassidão.
Quando Hannah Arendt chegou, ao fim de todos aqueles anos, ela afastou-se discretamente,
mas fez saber, minuto a minuto, da sua presença na cabana:
ruídos, passos, preparativos domésticos, vozes abafadas...

O velho caminhava por sendeiros
onde hoje só passam escuteiros... 



 






Friday, July 24, 2015

Thursday, July 23, 2015

Alegoria da Europa



Lorenzo Lippi, Allegoria della Simulazione

Tuesday, July 21, 2015

A saída do Euro



Masaccio, Adão e Eva expulsos do Paraíso

Tuesday, July 14, 2015

Rendições honrosas?



Velásquez, La Rendición de Breda

Sophia, hoje

Pranto pelo Dia de Hoje

Nunca choraremos bastante quando vemos 
O gesto criador ser impedido 
Nunca choraremos bastante quando vemos 
Que quem ousa lutar é destruído 
Por troças por insídias por venenos 
E por outras maneiras que sabemos 
Tão sábias tão subtis e tão peritas 
Que nem podem sequer ser bem descritas 

Sophia de Mello Breyner Andresen, in 'Livro Sexto' 

Monday, July 13, 2015

Sunday, July 12, 2015

Saturday, July 11, 2015

Um poema de Heine sobre a Alemanha



Caspar David Friedrich, Vacas perdidas num mar de gelo


Aber wir verstehn uns baß,
Wir Germanen auf den Haß.
Aus Gemütes Tiefen quillt er,
Deutscher Haß ! Doch riesig schwillt er,
Und mit seinem Gifte füllt er
Schier das Heidelberger Fass

Wednesday, July 8, 2015

Última homenagem a Maria Barroso



Vincent Van Gogh, Rosas Bravas


Floriram por engano as rosas bravas 
No Inverno: veio o vento desfolhá-las... 
Em que cismas, meu bem? Porque me calas 
As vozes com que há pouco me enganavas?

Castelos doidos! Tão cedo caístes!... 
Onde vamos, alheio o pensamento, 
De mãos dadas? Teus olhos, que um momento 
Perscrutaram nos meus, como vão tristes!

E sobre nós cai nupcial a neve, 
Surda, em triunfo, pétalas, de leve 
Juncando o chão, na acrópole de gelos...

Em redor do teu vulto é como um véu! 
Quem as esparze — quanta flor! —, do céu, 
Sobre nós dois, sobre os nossos cabelos?

Camilo Pessanha

(poema lido por José Manuel dos Santos no funeral de Maria Barroso)


          
          

Saturday, July 4, 2015

DE "LES ORIENTALES", Victor Hugo, 1829



Delacroix, Les Massacres de Chio, 1824


Depuis assez longtemps les peuples disaient : « Grèce ! 
Grèce ! Grèce ! tu meurs. Pauvre peuple en détresse,
A l'horizon en feu chaque jour tu décroîs.
En vain, pour te sauver, patrie illustre et chère,
Nous réveillons le prêtre endormi dans sa chaire,
En vain nous mendions une armée à nos rois.

« Mais les rois restent sourds, les chaires sont muettes.
Ton nom n'échauffe ici que des cœurs de poètes.
A la gloire, à la vie on demande tes droits.
A la croix grecque, Hellé, ta valeur se confie.
C'est un peuple qu'on crucifie !
Qu'importe, hélas ! sur quelle croix !

« Tes dieux s'en vont aussi. Parthénon, Propylées,
Murs de Grèce, ossements des villes mutilées,
Vous devenez une arme aux mains des mécréants.
Pour battre ses vaisseaux du haut des Dardanelles,
Chacun de vos débris, ruines solennelles,
Donne un boulet de marbre à leurs canons géants ! »

VICTOR HUGO